segunda-feira, 30 de maio de 2011

Velharias de cinema: 4 clássicos


Eu nunca fui dessas pessoas que ficam disseminando aquela ideia boba de que "não se fazem mais filmes como antigamente", "não se fazem mais músicas como antes", "bons tempos quando a Globo sabia fazer novela" e blá-blá-blá. Eu até sou uma pessoa nostálgica, mas é uma dessas nostalgias que nem você mesmo sabe muito bem o que é: de um passado realmente vivido ou de um antigamente idealizado que só existe mesmo na sua cabeça cheia de problemas? Talvez eu ainda seja novo demais para assumir esse discurso preguiçoso. Talvez eu ache essas frases feitas uma tremenda bobagem, já que vejo filmes ótimos, escuto músicas deliciosas e assisto a séries fantásticas, produtos ou obras de arte totalmente do nosso tempo.

Mas, ainda que eu seja um rapaz contemporâneo, não há como negar que estou passando por uma fase dessas meio nostálgicas, querendo rever coisas que vi quando criança/adolescente, ou mesmo ver pela primeira vez coisas que nunca tive coragem de ver, por preguiça mesmo. Talvez seja os 35 anos pesando, cobrando e dizendo que é chegada a hora de preencher certas lacunas cinematográficas e/ou musicais.

Diante das circunstâncias, tenho me entregado aos filmes de antigamente. Um "Se o meu apartamento falasse" aqui, um "Festim Diabólico" acolá. E também a uma extensa lista de coisas a serem vistas e descobertas: "Almas em Suplício", "Um Estranho no Ninho", por exemplo, só para citar dois.

Dos filmes revistos, clássicos de infância, já meio esquecidos, mas devidamente relembrados durante a revisão, às produções básicas que você vergonhosamente nunca assistiu. Tinha me esquecido, por exemplo, que O Mágico de Oz é um musical, um filme cheio de cores e que, em tempo de globalização, quando pessoas mudam de cidades e países em um piscar de olhos, traz uma mensagem um tanto ingênua: "não existe lugar como nosso lar". Mensagens a parte, é um deleite ver Dorothy - uma menina um bocado chata, é verdade - vivendo aventuras ao lado de um espantalho sem cérebro, um homem de lata sem coração e um leão sem coragem em meio a uma estrada de tijolos amarelos, sempre com o fiel Totó a tiracolo.

Ben-Hur não é um filme para criança, mas é um desses clássicos da Sessão da Tarde que passava durante a Semana Santa. Épico no melhor sentido do termo, o filme é um exercício de estilo e ação em uma época em que o CGI não era nem um sonho, e a edição das cenas era clara, nada picotada e fragmentada para esconder falhas. A cena da batalha das vigas é de um apuro técnico que impressiona, e a história de vingança ganha ares esperançosos em um final melancólico e de redenção religiosa. O longa, de quase quatro horas de duração, é a maior referência de épicos até hoje (o "Gladiador", de Ridley Scott, por exemplo, não deixa de ser um remake mais amarelado do filme de William Wyner).

Outro épico trabalhado em um registro diferente de "Ben-Hur", esse vergonhosamente nunca visto, E o Vento Levou... é realmente emocionante e ainda ousa ao não trazer um final feliz. Narrando, também ao longo de quase quatro horas, a vida, os dramas e os amores de Scarlett O'Hara em meio a guerra da secessão nos Estados Unidos, é suntuoso, histórico e dirigido com precisão por Victor Fleming, que, no mesmo ano, também foi o responsável por "O Mágico de Oz". Ainda que quatro horas sejam quatro horas, o longa é obrigatório para quem quer entender o nascimento da narrativa clássica hollywoodiana.

Também ousando ao entregar um final não feliz, o musical Amor, Sublime Amor definiu uma geração e foi um dos últimos exemplares da grande era de um gênero que já dava sinais de exaustão. Modernizando a trama clássica de Romeu & Julieta, de William Shakespeare, o filme de Jerome Robbins e Robert Wise transforma a história de amor de dois jovens de famílias rivais em uma briga de gangues na Nova York dos anos 1960. Ainda que seja apoiado na velha história do "amor romântico" de jovens que se apaixonam sem nem mesmo se conhecerem (algo difícil de ser engolido pelas plateias de hoje), o filme mantém seu vigor narrativo e traz uma apresentação impecável de personagens e um início ainda hoje empolgante. As músicas totalmente integradas à narrativa e as cenas de dança belissimamente coreografadas completam o espetáculo.

Bobagem que o cinema não faça mais, hoje, filmes tão bons quanto antigamente. Mas isso não quer dizer que, antigamente, o cinema não tenha produzido pérolas incomparáveis.

sábado, 21 de maio de 2011

Notas musicais: Lady Gaga

Lady Gaga é uma idiota. Fala demais e quer o tempo todo chamar atenção para si, e não para sua música. Alguns vão dizer que em tempos de redes sociais e YouTube, ela está mais do que certa. Mas tudo tem limites, e ela extrapola todos. Para o mal. A artista posa de original, mas o máximo que podemos dizer é que ela é criativa, já que não passa de um remix de um monte de coisa que já vimos no passado: David Bowie, Madonna, Grace Jones e mais uma penca de gente.

Não que isso seja pecado. Lady Gaga não está sozinha na era do remix e dos liquidificadores culturais de referências. O problema, mais uma vez, é sua falta de tato, e mesmo carisma (talento ela tem, não dá para negar), para soar mais autêntica e menos fake.

Dito isso, a maior falha de Born This Way é, justamente, a própria Gaga. Além das frases e atitudes "polêmicas" pra divulgar o trabalho, a artista caiu na besteira de anunciar uma revolução pop, quando, na verdade, entrega um álbum apenas ok e sem grandes novidades. Born This Way está longe de ser uma revolução, mas também não é nenhuma tragédia anunciada pela propaganda negativa que a superexposição da artista costuma causar.

Longe de ser um exemplar na linha "Ame ou Odeie", o álbum novo de Gaga fica em cima do muro entre ser um lixo descartável, mas divertido, e um produto pop de qualidade, com algo realmente a dizer. As piores músicas são os primeiros singles, pretensiosos, mal produzidos e aquém de canções como "Paparazzi", "Telephone", "Just Dance", "Bad Romance", por exemplo.

Born This Way e Judas (que ganharam péssimos videoclipes), "Hair", "The Edge of Glory" são puro lixo e só devem agradar aos fãs mais ardorosos, aquele tipo que gosta de qualquer porcaria que o ídolo faça. O resto do CD traz algumas boas canções, algumas vezes prejudicadas por uma produção farofa indigna dos tempos atuais.

Em uma época em que Kanye West prova que música pop também pode ser luz, é uma vergonha uma cantora do porte de Gaga apresentar um trabalho tão desleixado e que, às vezes, faz Gaga soar como uma Shania Tawn ("You & I") ou qualquer outra cantora ruim saída dos anos 90 ("Bad Kids", "Highway Unicorn").

Entre mortos e feridos, "Americano" é o cúmulo do exagero e, se Gaga fosse inteligente, teria sido o primeiro single. "Schibe" também é uma delícia de se ouvir, trazendo a cantora tentando enrolar um alemão macarrônico feito para bombar nas pistas. "Bloody Mary" e "Electric Chapel" são outras faixas que seguram a audição do disco. A melhor, porém, é "Heavy Metal Lover", talvez a canção mais bem cuidada do trabalho, de produção mais limpa e com camadas, sem a sujeirada da maioria das outras músicas.

Depois de mais de dois anos divulgando The Fame/The Fame Monster, seria Born This Way o primeiro passo para o tropeço de Gaga? Infelizmente, bem pouco provável, dirão alguns. Se Britney Spears, Christina Aguilera, Mariah Carrey e tantas outras estão aí até hoje, difícil Gaga perder assim espaço só porque ela passou longe da revolução prometida. Se ela for esperta, Born This Way vai pelo menos servir para ela se expor menos, parar de falar tanta besteira e se concentrar mais na sua música. Ou não.

sábado, 14 de maio de 2011

Os Agentes do Destino

O sorriso e o carisma de Matt Damon podem não salvar vidas, mas salvam filmes. Não que Os Agentes do Destino seja um fiasco, longe disso. É um filme atraente, bem conduzido, mas que peca apenas por ser explicativo demais e forçar um pouco a barra para ter um final feliz. Como filmes dependem muito do momento em que o assistimos, não posso negar que me deixei levar pelo sorriso do ator e acabei me envolvendo sem muitas ressalvas.

Misto de romance com ficção científica, mais romance do que ficção, na verdade, "Os Agente do Destino" sofre do mesmo mal de outras adaptações do mestre Philip K. Dick (autor de contos que deram origens a longas tão distintos quanto "Blade Runner", "O Pagamento", "O Vingador do Futuro" e "Minority Report"). O conceito das obras é sempre interessante, mas o desenvolvimento dos filmes nem sempre. O filme de George Nolfi padece dessa mesma sina, mas ainda assim prende a atenção.

Nolfi opta por fazer um filme elegante, de realização refinada, ainda que as cenas de ação sejam dinâmicas. O desenvolver da trama é meio frouxo, com várias elipses temporais que não ajudam muito narrativamente falando. Mas a química entre o sorrisão de Matt Damon e o sotaque de Emily Blunt conserta qualquer derrapada e ajuda o espectador a entender a opção da produção pender para um caráter mais romântico.

Entre perseguições e uma trama que tem toques de Matrix e A Origem, são as cenas entre Damon e Blunt que despertam a atenção do público. A discussão sobre destino e livre arbítrio é meio deixada de lado e faz falta em alguns momentos, mas tudo depende de como você encara a produção e também de suas expectativas iniciais.

segunda-feira, 9 de maio de 2011

Dores & Amores

Nicole Kidman e Aaron Eckhart sofrem pela perda do filho pequeno. Cada um a seu jeito. Ele vê os vídeos  do filho e se reúne com um grupo de pais que passaram pela mesma dolorosa experiência. Ela adota uma postura distante e amarga e não assume a própria dor. Em Reencontrando a Felicidade, o casal tem que enfrentar a si mesmo para salvar o casamento.

Eles também sofrem ou sofreram. Não pela perda de alguém, mas em virtude de um amor violento. Acusações, humilhações, espancamentos, ameaças e outras práticas bizarras fazem ou fizeram parte de suas rotinas. Personagens sem rosto que ganham as feições de atores para narrar suas histórias no docudrama Amor?

O primeiro é um drama sensível e que foge dos recursos de um melodrama fácil. Dirigido por John Cameron Mitchel ("Hedwig and the angry inch" e "Shortbus"), um cineasta com talento para a composição visual e narrativas elaboradas, "Reencontrando a Felicidade" traz um tema batido e recorrente. Mas o olhar delicado e sensível de Mitchell joga o espectador no meio do turbilhão de emoções que consome o casal Becca e Howie, fazendo o público esquecer que já viu essa história recentemente, ainda que em outras roupagens ("Anticristo", de Lars von Trier, é um exemplo).

"Amor?" apresenta uma série de depoimentos sobre casos de amores violentos. Alguns são bastante fortes e comovem. Outros não convencem. Dirigido por João Jardim, o docudrama opta por esconder o rosto de seus personagens sob a máscara de atores conhecidos (Lilia Cabral, Ângelo Antônio, Eduardo Moscovis, Julia Lemmertz, entre outros). O recurso nem sempre funciona, e a impressão que fica é que a encenação tira um pouco da força das histórias. A comparação com Jogo de Cena, de Eduardo Coutinho, é imediata, e, ainda, que os filmes tenham suas particularidades, a obra de Jardim perde na comparação.

Em "Reencontrando a Felicidade", a melancolia é a chave utilizada por Mitchell. O ritmo do filme é lento, e as relações entre os personagens conduzem o longa. Os conflitos entre Becca, a mãe e a irmã, a tentativa quase desesperada dela se aproximar de um adolescente, o enlace entre Howie e a colega de grupo. Todas as relações funcionam como contraponto para a própria falta de contato entre o casal. A opção de abrir espaço para os atores brilharem é adequada, e Kidman e Eckhart aproveitam a oportunidade para entregar interpretações de partir o coração.

Já em "Amor?", as interpretações ficam em segundo plano. E isso pesa contra o próprio filme. Indeciso entre  a encenação ficcional e o distanciamento documental, o diretor insere cenas que funcionam como um interlúdio entre os depoimentos, mas que nada agregam dramaticamente. A linguagem também não está em discussão. A dicotomia entre real e ficção não está em jogo, como no filme de Coutinho. Essa opção coloca todo o foco no tema do filme, a discussão um tanto simplista sobre os limites do amor. O resultado é um docudrama interessante, mas que não alça voo, fica na superfície e no óbvio.

Se em "Reencontrando a Felicidade", uma encenação mais crua e fria funciona para mostrar ao espectador que aquele não é um filme de redenção, muito menos de catarse, em "Amor?", o tom adotado é também o de distanciamento e o não julgamento de seus "personagens", mas, aqui, o resultado pouco emociona, muito menos acrescenta algo sobre o tema.