quarta-feira, 27 de março de 2013

Um romance russo x uma viagem fantástica por Oz

Dois dos últimos filmes que vi no cinema apelam fortemente para o visual. Ainda que em direções e com propostas bem opostas, tanto “Oz, Mágico e Poderoso” quanto a mais recente adaptação literária do romance “Anna Karenina” têm nas questões estéticas seus maiores valores.
 
Oz, Mágico e Poderoso é tipo uma produção prima-irmã do horroroso “Alice no País das Maravilhas”. Mas apesar de ser bem irregular e estar longe de parecer um filme do Sam Raimi (“A Morte do Demônio” e “O Homem-Aranha”), o longa não chega a ser tão ruim quanto à produção dirigida por Tim Burton. Apostando forte nas cores, figurinos e cenários que chamam mais atenção do que as interpretações e a própria história em si, Raimi cria uma obra visual bela de se ver, mas vazia de sentido ou de identidade.
O ritmo é arrastado, e a proposta do filme é bem pouco convincente. Os personagens são ocos e esquemáticos. E as soluções visuais, pouco criativas. As interpretações seguem caminho semelhante. Rachel Weisz e James Franco entendem o conceito meio farsesco do longa e embarcam na brincadeira. Michelle Williams se esforça, mas não convence. Já Mila Kunis é quem está pior na tela e quase estraga tudo (a maquiagem da atriz na segunda metade é infeliz e também não ajuda).
 
Apesar de fraquinho, Oz, Mágico e Poderoso ganha certa força e ritmo no ato final, quando presta uma homenagem ao primeiro cinema e resgata um pouco da emoção de O Mágico de Oz original. Mas é muito pouco para salvar um filme que está mais preocupado em ser um produto e abraçar sem reservas a linha lição moral Disney de ser do que ser cinema, ainda que de entretenimento.
Anna Karerina é muito mais feliz na sua opção de ser “um filme para os olhos”. Novo trabalho do competente Joe Wrigh (“Orgulho e Preconceito” e “Desejo e Reparação”), a adaptação da obra de Leo Tolstoy é suntuosa o suficiente para encantar os admiradores de produções de época com figurinos cheio de babados, plumas e paetês e uma direção de arte elaborada.
 
Partindo do pressuposto que todo filme de época não deixa de ter certa encenação teatral, principalmente no que diz respeito ao comportamento conservador dos personagens, sempre atuando frente à sociedade para parecerem mais civilizados do que realmente são, Wrigh opta por deixar isso o mais escancarado possível por meio de escolhas estéticas e narrativas. Grande parte do longa é encenado dentro de um teatro, a direção de arte aproveitando todos os espaços possíveis para contar a história de Anna Karenina, que se apaixona, trai o marido (Jude Law) e escandaliza a sociedade russa no final do século 19.
A direção de Wrigh dá dinamismo ao filme e deslumbra o espectador em sua primeira metade. Em alguns momentos, o longa nos faz lembrar da estrutura de “Arca Russa”, de Aleksandr Sokurov, que usa os espaços de um museu para contar, aparentemente sem cortes, a história da Rússia. Claro que a produção de Wrigh não chega a ser tão radical, mas a utilização cênica do teatro, aliada à edição que transforma algumas cenas em um balé sem cortes, remete ao trabalho marcado de Sokurov.
 
Passada essa primeira metade, Anna Karenina vai se esvaziando. O encantamento inicial vai deixando de fazer efeito, e a beleza do longa deixa de ser narrativamente justificada para ser apenas mero arrojo estético. A fotografia é um desbunde, os figurinos são belíssimos, a direção de arte é ousada e usada a favor da narrativa, mas falta algo. Algo que não pode ser emulado por cores, vestidos ou cenários. Falta emoção.
Parte do problema é que a personagem central não desperta nenhum tipo de empatia do público. Keira Knightley é boa atriz, se esforça e fotografa muito bem em vestidos e cenários de época, mas parece deslocada. A química e a paixão entre ela e Aaron Taylor-Johnson nunca decola e falta peso ao drama vivido pelo trio central (nos dias cínicos de hoje, paixões que surgem apenas com um olhar parecem cada vez mais falsas, ainda que ambientadas em figurinos do passado).
 
Nunca fica claro se essa é mesmo a proposta do diretor, mais preocupado em inovar narrativamente, ou se é uma questão de miscasting. A partir dessa “falha”, o filme fica muito mais interessante quando foca na trama dos personagens coadjuvantes. Ainda assim, “Anna Karenina” é um longa que merece ser visto na tela grande e é muito mais interessante e ousado que mais da metade dos filmes indicados ao Oscar deste ano. E em termos técnicos e de beleza, supera e muito o 3D e as cores berrantes e genéricas de “Oz, Mágico e Poderoso”.

sexta-feira, 8 de março de 2013

Pílulas para não deixar passar em branco

Hitchcock – O mestre do suspense merecia homenagem melhor do que este filme genérico sobre as filmagens do clássico “Psicose”. Indeciso entre a homenagem ao cineasta e o drama matrimonial, o longa se perde com um roteiro sem graça e a direção qualquer nota do estreante Sacha Gervasi. A interpretação caricata de Anthony Hopkins e a maquiagem equivocada (indicada ao Oscar!!!) reforçam o tom inadequado da produção. Salvam-se os esforços de Helen Mirren (que está bem, mas faz apenas o feijão com arroz) e Scarlett Johansson (pouco aproveitada, mas luminosa). O restante do elenco (Danny Huston, Toni Collette, Jessica Biel, James D´Arcy) pouco aparece. No final, o filme lembra produções como “Sete Dias com Marilyn”, simpática, mas totalmente esquecível.

A Hora Mais Escura – O novo filme da orcarizada Kathryn Bigelow pode não ter o mesmo senso de entretenimento de “Argo”, mas é muito mais cinema. Com um ritmo tenso, mas longe da edição frenética vigente no cinema de ação, Bigelow narra a caça do governo dos EUA, por meio da vontade de uma mulher (Maya, interpretada com força por Jessica Chastain), ao terrorista Osama Bin Laden. O roteiro é bem construído, e Bigelow imprime peso ao filme e mostra toda sua competência durante o clímax da produção. Com edição e fotografia caprichadas, um elenco de apoio competente e uma resonância histórica que ainda reverbera nos dias de hoje, “A Hora Mais Escura” perdeu visibilidade graças às acusações de que o filme seria pró-tortura. Sim ou não, é uma produção que merecia mais atenção.

Deixe a Luz Acesa – Não existe final feliz no “cinema gay”. Em “Deixe a Luz Acesa”, Ira Sachs conta o início, o meio e o fim do relacionamento entre Erik (o ótimo Thure Lindhardt) e Paul (Zachary Booth). Os dois se amam, mas a relação conturbada é permeada por drogas, sexo e traições. A direção convencional de Sachs e o roteiro elíptico, que de certa forma diminuem a força da história, são compensados pela intensidade das interpretações e por algumas cenas de destruir corações. Mesmo sendo um filme duro que retrata as dificuldades de um relacionamento, “Deixe a Luz Acesa” opta pela melancolia ao invés da tristeza. O final é esperançoso, mas está longe do final feliz das comédias românticas.