terça-feira, 13 de maio de 2014

Trilogia involuntária: Clube dos Corações Indies Solitários

Para mim, Lost in Translation, Eternal Sunshine of the Spotless Mind e Her formam uma bela trilogia. São filmes diferentes, com diretores e atores diferentes e assinaturas visuais distintas, mas que funcionam muito bem em conjunto quando assistidos um atrás do outro. Os três filmes têm em comum casais bem diversos entre si que sofrem ao som de uma trilha sonora indie e se dividem entre desejo e realidade. Os três longas são quase como uma trilogia indie para corações solitários, cada qual trazendo um olhar melancólico sobre o amor e suas consequências em jovens adultos perdidos na vida.
 
Lost in Translation é o mais poético dos três e o menos apegado a uma narrativa. O filme é uma espécie de passeio pelas ruas de Tóquio, onde um ator de sucesso esbarra na esposa solitária de um fotógrafo. A diferente de idade entre os dois é grande, mas a química entre Bill Murray e Scarlett Johansson dissolve essa questão em poucos minutos. Ambos são casados e infelizes, estão em Tóquio a contragosto e descobrem em uma amizade furtiva uma saída para a realidade entediante. Entre noite dançantes no karaokê e doses de uísque no bar do hotel, a amizade errante dos dois se transforma em um amor que nunca se consuma. Sofia Coppola usa as luzes e o neon de Tóquio e a trilha sonora indie perfeita para embalar uma obra bem mais apegada à contemplação do que à história e se sai muito bem construindo o romance moderno perfeito.

Eternal Sunshine in the Spotless Mind segue um caminho distinto, ainda que faça uso da melancolia como estratégia. Clementine e Joel se conheceram, se amaram, se odiaram e esqueceram um ao outro, não como um processo natural da vida, mas porque ambos passaram por um procedimento que deleta da memória as lembranças indesejadas. Indo e voltando no tempo em um roteiro genial todo amarradinho de Charlie Kaufman, o filme de Michel Gondry é uma delícia de destruir corações. Amparados por atuações camaradas de Jim Carrey e Kate Winslet, o longa explora aquele desejo não tão secreto assim de esquecer completamente as pessoas e as coisas que nos magoaram. Mas, ao mesmo tempo em que abraça essa premissa, o roteiro nos mostra que a dor vem justamente porque antes existiram bons e grandes momentos que merecem ser guardados. A direção típica de Gondry, dono de uma assinatura visual bem peculiar, envelheceu um pouco com as repetições estéticas do cineasta em outros filmes e videoclipes, mas a força da história permanece.

Her, de Spike Jonze, fecha a trilogia apostando no caminho do meio termo. O olhar de Jonze não deixa a poesia se sobrepor à dramaticidade como no trabalho de (sua ex-mulher) Sofia Coppola, mas também não se prende tanto ao roteiro como na produção de Gondry. Passeando entre a beleza de suas imagens e direção de arte e a força da palavra, Jonze retrata uma relação além do conceito de normal para discutir várias questões pertinentes ao nosso comportamento nos dias de hoje. Theodore (interpretado lindamente por Joaquim Phoenix) é um moço que ainda sofre com a separação da ex-mulher (Rooney Mara) e que se pega em um relacionamento com seu novo sistema operacional (mais uma Scarlett Johansson, aqui apenas em voz deliciosamente sedutora). Os tons pastéis na fotografia e nos figurinos e a trilha sonora melancólica, cortesia de parte do Arcade Fire, embalam muito bem a proposta de Jonze em construir uma produção agridoce que vai muito além do rótulo de comédia romântica.

Os três filmes, na verdade, trabalham muito bem nessa chave que mistura elementos da comédia romântica (garoto encontra garota) com muitas pitadas de drama para discutir amor, relacionamento, possibilidades, memória, desejo, expectativas e por aí vai. O melhor: ambos são melancólicos, mas terminam cheios de esperança.

PS: os três filmes levaram para casa o Oscar de melhor roteiro original, ou seja...

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